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Almanaque Anual 1766 (citado em Daniel Roche, France in the Enlightemment, 1998)*
*Darrin Mcmahon, Uma História da Felicidade, Lisboa: Edições 70, 2009, p.253 (trad. Jaime Araújo)
Almanaque Anual 1766 (citado em Daniel Roche, France in the Enlightemment, 1998)*
*Darrin Mcmahon, Uma História da Felicidade, Lisboa: Edições 70, 2009, p.253 (trad. Jaime Araújo)
Escolhi este poema de Fernando Pessoa para acompanhar o relógio do meu campanário. Que o tempo que vem seja sorridente e deixe adormecer o Velho Ano com paz e alegria!
A lua por trás da torre
A lua por trás da torre
Faz a torre diferente.
A verdade, quando morre
Morre só porque não mente.
Mente a lua que se esconde
Por trás da torre de aqui,
Mente a torre porque é onde
A lua não está ali.
A lua é só um reflexo
A torre é um vulto somente,
E assim, num íntimo nexo,
Qualquer diz verdade e mente.
E é desta mista incerteza
De verdade e de mentira
Que nasce toda a beleza ―
Que desta hora se tira.
Saibamos, dando guarida
Ao que tudo é de metade,
Fazer bela a nossa vida
Mentindo com a verdade.
Fernando Pessoa, In Poesia 1931-1935 e não datada , Assírio & Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas, Madalena Dine, 2006 (Casa Fernando Pessoa)
Pink Floyd, Time
Städelaches Kunstinstitut. Frankfurt. Alemania.
(detalhe do volante direito: Duque João, o Resoluto, irmão do monarca abaixo assinalado, Frederico III)
(Detalhe volante esquerdo: Frederico, o Sábio, monarca da Saxónia)
No centro Maria vestida de azul e Santa Ana com o Menino. José encontra-se acocorado. No plano acima estão, não sei por que ordem(?) o Imperador Carlos V, o soberano Frederico, o Sábio e o duque João. (acrescentado17:30h) Vai chegar um Menino que dizem veio para salvar os homens. Creio que a sua beleza é capaz de o fazer... mas ainda não o encontrei. Um Menino que sabia o seu triste fim e não se revoltou.
Apesar das dúvidas utilizo Caeiro: "A mim ensinou-me tudo./Ensinou-me a olhar para as coisas./Aponta-me todas as coisas que há nas flores".
Poema do Menino Jesus
Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!
Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.
A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.
Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou -
"Se é que ele as criou, do que duvido." -
"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres."
E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.
A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.
A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.
Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.
Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.
Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.
Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam ?
Alberto Caeiro
George Michael - December Song (I Dreamed of Christmas)
Corelli - Sarabande
Il Silenzio
Conosco una città
che ogni giorno s’empie di sole
e tutto è rapito in quel momento
Me ne sono andato una sera
Nel cuore durava il limio
delle cicale
Dal bastimento
verniciato di bianco
ho visto
la mia città sparire
lasciando
un poco
un abbraccio di lumi nell’aria torbida
sospesi
Giuseppe Ungaretti (surripiado da internet )
Não foi por um Anjo ter entrado (faz essa ideia tua)
que ela se sobressaltou. Tão pouco como outras,quando
um raio de sol ou à noite a lua
nos seus quartos se vão instalando,
se sobressaltam, ela não tinha o hábito de se indignar
à vista da figura do Anjo assumia;
ela mal sabia que este ali ficar
para os anjos é laborioso. (Oh se fosse possível saber como ela era pura. Não foi uma cerva que, a salvo,
deitada na floresta, dela se apercebeu,
equivocando-se de tal modo que concebeu,
sem sequer ser coberta, o Licorne mais alvo
o animal feito de luz,o mais puro de conceber.)
Não por ele entrar, mas o Anjo inclinar
para ela, tão de perto, o rosto que vinha anunciar,
tão jovem; e que de ambos o olhar se entrechocasse
quando um outro se encontrasse,
como se em volta tudo vazio parecesse
e que milhões de seres olhavam, faziam, suportavam,
nela se concentrasse: ela e ele apenas ali se encontravam;
Olhar e ser olhado, olhos e deleite para a vista
em mais nenhum lugar senão aquele: repara
isso sobressalta. E o susto de ambos era coisa prevista.
Então entoou o Anjo a sua melodia clara.
Rainer Maria Rilke, A Vida de Maria, Lisboa: Portugália Editora, 2008, p.41 (Trad. e pref. Maria Teresa Dias Furtado)
Antonello Messina - Annunciation
J. S. Bach - Magnificat
O café pode ser um momento de prazer, de pensamentos e de tertúlias.
Este é o provérbio que encontramos no link assinalado:
"O café deve ser escuro como o breu, forte como um touro e tão doce como o amor."
Provérbio Turco
Ao tomar o café doce, forte e escuro encontrei sobre a mesa um panfleto onde li:
"Há um sol esplendente nas coisas"
Verso de Mário de Cesariny
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxProcura...
Picasso, Das Gesicht des FriedensArt Movement - Classic Modernism - Size 40 cm x 50 cm
Manuel Poppe, Sombras em Telavive, Lisboa: Teorema, 2001, p.84
Acrescentei o texto depois do comentário belo de Margarida Elias.
* Zvi Mairovich é um pintor israelita que nasceu numa aldeia da Polónia em 1911 e faleceu em 1974. Só conheci este pintor com a leitura deste livro.
Não haver gestos nem palavras novas!
Florbela Espanca, Diário do último ano, Lisboa:Bertrand, 4ª ed., 1998, p. 61
*(Edição fac-similada, prefácio de Natália Correia)
Quando não há gestos nem palavras novas valerá a pena viver?
**Hermann Kaulbach's 1872 oil painting "Mozart's last days," depicting the death of Wolfgang Amadeus Mozart. Based on eyewitness accounts of the composer's final days, Mozart may have died from acute kidney failure brought on by a strep throat epidemic that appears to have arisen from a local military hospital.
(Imagno/Getty Images)
O filme Amadeus realizado por Milos Forman, em 1984, encantou-me. A escrita do Requiem é o excerto que escolhi para associar à pintura: Últimos dias de Mozart.
Amadeus - Salieri y Mozart
Tom Hulce no papel de Wolfgang Amadeus Mozart
F. Murray Abraham.no papel de Antonio Salieri
Vivaldi - Concerto for Two Violins in A Minor RV522
Tal como Rilke de tempos a tempos a vida assemelha-se a círculos, parecendo que voltamos ao ponto de partida. Será sempre assim?
Chopin Nocturno n.º 4, Maria João Pires
O sol não tem aquecido e a lua não aparece...
persistência da melancolia.
Colour printed finished in ink and watercolour, Illustration to Milton's "Lost Paradise", Tate Gallery, London
E para finalizar alguns trabalhos dele ao som de Vivaldi.
William Blake - British Romantic Writer and Painter and Illustrator, 1757-1827 and Vivaldi: Gloria, for 6 solo voices, chorus, trumpet, 2 oboes, 2 violins, 2 violas, 2 cellos, strings & continuo in D major
Yundi Li - Chopin "Fantasie" Impromptu, Op. 66
Faenol Festival 2003: 3. In Trutina (from Carmina Burana) - Hayley Westenra
A obra Pequeno Atlas do Sistema Solar, da autoria de Eduardo Ivo Alves, será apresentada no próximo dia 23 de Novembro (3.ª feira), pelas 18h30m, na Livraria Fnac Coimbra.
A apresentação estará a cargo de Pedro Pina, investigador do Instituto Superior Técnico.
Eduardo Ivo Alves é Professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra, é geólogo e ultimamente tem se dedicado à investigação planetária. O livro é publicado pela Imprensa da Universidade de Coimbra e destina-se ao grande público.
E a beleza de Peste vista de Buda, Budapeste, Húngria
Maria Callas faz desta morte o encontro com a serenidade!
Staatliche Museen, Berlin
[A tela] Representava uma mulher de pé diante de uma mesa, de perfil, voltada para um espelho na parede. Tinha um manto sumptuoso de cetim amarelo debruado a arminho branco, e uma elegante fita vermelha de cinco pontas no cabelo. Uma janela iluminava-a da esquerda, e a luz incdia-lhe na face e delineava a curva delicada da testa e do nariz. Estava a pôr um colar de pérolas ao pescoço, a puxar as fitas para cima, com a mão no ar. Fascinada com a sua própria imagem no espelho, não parecia consciente de que alguém a olhava. (...)
Senti vontade de pôr aquele manto e as pérolas. Senti vontade de conhecer o homem que pintava assim aquela mulher.
Tracy Chevalier, Rapariga com Brinco de Pérola,Lisboa: Quetzal, 2008, p.40.
J. S. Bach - Prelude and Fugue n.1 in C Major BWV 846 (WTC I)
OrFée au Lavoir Moderne Parisien nous chante illusion. Batterie: Edouard Coquard; piano: Michel Goubin; basse: Benoît Domuynk e guitare: Donatien Roustant
«Um retrato pintado com a alma é um retrato, não do modelo mas do artista»
Oscar Wilde (citador)
Flow My Tears
Flow, my tears, fall from your springs!
Exiled for ever, let me mourn;
Where night's black bird her sad infamy sings,
There let me live forlorn.
Down vain lights, shine you no more!
No nights are dark enough for those
That in despair their lost fortunes deplore.
Light doth but shame disclose.
Never may my woes be relieved,
Since pity is fled;
And tears and sighs and groans my weary days
Of all joys have deprived.
From the highest spire of contentment
My fortune is thrown;
And fear and grief and pain for my deserts
Are my hopes, since hope is gone.
Hark! you shadows that in darkness dwell,
Learn to condemn light
Happy, happy they that in hell
Feel not the world's despite.
John Dowland
Andreas Scholl