23/11/2010

A Verdade... entre o silêncio

Ontem vi a entrevista de Judite de Sousa a um ex-casapiano. Fez-me impressão a dor que ainda se observa na fisionomia do rapaz. Não confio na justiça ou pelo menos sou menos crente.
Assolaram-me uma série de associações, nada interligado... Abomino a violência, o desrespeito, o abuso do mais forte sobre a fragilidade.
A sensibilidade não existe nestes meios. É um mundo que desconheço e o qual não imagino, felizmente. Custou-me ver aquele jovem que não nomeio porque julgo que ele precisa de paz e de "silêncios" para se reencontrar. Há no entanto, uma particularidade que me espantou e não compreendo, ele ainda via como um pai a pessoa que o conduziu para uma vivência dolorosa.
Depois deste desabafo só me lembrei do poema de Fernando Pessoa: Achar a Montanha e da tinta da china de Cruzeiro Seixas: A Terra e o Céu.
Que do Céu chovam cavaleiros da justiça e que da Terra se procure a luz da verdade. E que a verdade tenha um sentido duplo.
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Cruzeiro Seixas, A terra e o Céu, tinta da china sobre papel Retirada daqui
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A Montanha por Achar

A montanha por achar
Há-de ser quando a encontrar,
Um templo aberto na pedra
Da encosta onde nada medra.

O santuário que ter,
Quando o encontrar, há-de ser
Na montanha procurada
E na gruta ali achada.

A verdade, se ela existe,
Ver-se-á que só consiste
Na procura da verdade
Porque a vida é só metade.

Fernando Pessoa, In Poesia 1931-1935 e não datada , Assírio & Alvim, ed. Manuela Parreira da Silva, Ana Maria Freitas, Madalena Dine, 2006

12 comentários:

  1. Violência, abuso, injustiça. Que bom que essas palavras desaparecessem do mundo!
    Infelizmente, estão presentes de mais no nosso quotidiano.
    O que se dabe do sofrimento dos outros?
    Um beijinho e obrigada por "falar", protestar...

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  2. Estas situações são tão terríveis que é difícil falar delas e creio que as pessoas preferem o silêncio não só por vergonha, mas também por não quererem acreditar que são verdade. Mas de facto, é preciso falar delas, denuncia-las, para que se possa evitar que voltem a acontecer. Só não entendo é como as pessoas que cometem os crimes conseguem viver com elas mesmas e dormir bem de noite...

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  3. MJ Falcão,
    Não consegui calar-me, fiquei impressionada. Embora haja mais detalhes a equacionar, deu-me vontade de desabafar.
    Obrigada pela sua visita e opinião.
    Um beijinho.

    Margarida,
    Concordo inteiramente com o que afirma e estou em sintonia com a sua opinião. Como podem dormir?
    Um beijinho.

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  4. Eu ainda confio na Justiça, e até na Casa Pia, instituição onde se fez e continua a fazer uma série de reformas, da segurança (que falhou muito ao permitir que jovens saissem e entrassem a qualquer hora) à vertente pedagógica. Foi horrível o que sucedeu a estes jovens, mas a verdade é que são, felizmente, poucos se tivermos em conta os milhares de alunos, internos e externos, da Casa Pia.

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  5. Eu sei de histórias terríveis! E parabéns pelo excelente post!

    Uma pergunta: acha que viajei demais?...

    Olhe, se entender que é possível, gostaria de ter uma morada sua, para lhe enviar um livro meu.

    Deixo-lhe o meu mail:

    manuel.poppe@hotmail.com

    Um grande abraço.

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  6. Ana, eu também vi. E estava consumida.
    Eu também não acredito na justiça, basta olhar ao redor.
    E quem vai contra os Direitos Humanos e já não entro pelo restante, infelizmente dorme melhor do que qualquer um de nós.

    O poder perante o mais fraco, o abuso, a chantagem a tortura.Tudo com base no poder, uso e abuso.

    Não consigo colocar-me no mesmo lugar, é um mundo que me assusta e também desconheço, mas prefiro nem dizer o que seria justiça para mim nalguns casos.

    Eu tenho um filho e te garanto que a nossa justiça a mim não me dava consolo. Eu penso e refiro sabendo que é incorrecto, na justiça que teria vontade de fazer com as minhas próprias mãos.

    Sei o que é não conseguir provar algo grave, sei o que é ter que pensar antes de abrir a boca, por não ter provas e saber que ninguém iria acreditar em mim. Optei porque naturalmente sou assim por abrir a boca, fiquei sem emprego, mas dormi descansada.

    Esse poema é incrivelmente belo.

    Um beijo e obrigado.

    Blue

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  7. Luís,
    Muito obrigada pela sua visita. Pois, eu estou menos crente em relação à justiça, embora, não conheça tecnicamente o processo. A minha descrença vai para a justiça no sentido que abarca o terceiro poder da Constituição e a justiça no sentido filosófico, ético e moral.
    Bjs.

    Manuel Poppe,
    Não existe viajar demais. Fico contente por ter viajado.
    Quem me dera poder fazê-lo.
    Acerca do seu livro, estou sem palavras:
    - Muito, muito obrigada. Dentro em breve contactarei.
    Um abraço!

    Blue,
    Obrigada pelo seu comentário.
    Estou em sintonia consigo. E o que conta é terrivelmente injusto.
    O poder que as pessoas têm em decidir da vida dos outros afastando-os do seu modo de ganhar a vida, é angustiante e desconsolador num Estado democrático!
    Sentirmo-nos esmagados com a injustiça é das piores dores que se pode ter. Mas infelizmente,é assim...
    Resta-nos ler o grande Fernando Pessoa e olhar para a beleza da pintura de Cruzeiro Seixas para pensarmos que há pessoas que constroiem.
    Bjs.

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  8. Eu é que lhe agradeço a sua amizade!
    Um beijo!

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  9. O que é particularmente irritante nesta «justiça», Ana, é que o meio de prova por excelência do crime em causa é a prova testemunhal. Mas parece ser porque a sentença assenta basicamente nesse meio de prova (como é lógico e legal que assente), que o processo está sendo contestado. Há tempos, alguém dizia que ainda acabaremos precursores no domínio do direito penal, criando a nova figura do crime sem criminoso. Ou, pior ainda, a figura do crime em que o criminoso é a própria vítima. Tristezas!

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  10. Luísa,
    Que bom vê-la por aqui. "Tristezas"...diz bem.
    O que afirmou é tão pertinente que aguardaremos uma decisão justa, isto é, sem demagogias.

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  11. Não vi a entrevista, mas percebo que por vezes o vazio afectivo é de tal dimensão, que nos agarramos ao pouco que sobra. E no que toca a qualquer forma de abuso, nunca é demais abordar o assunto e combatê-lo com veemência.
    Bem haja por relembrá-lo, Ana.

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  12. R,
    Que bom vê-la por cá e obrigada pelas suas palavras.

    Bom fim-de-semana!

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