A música joga com as sensações, eleva-nos o estado da alma - vibrar ao som da música - é uma expressão que ouço desde pequena.
Susan Sontag escreveu este apontamento no momento em que estava a ouvir um Concerto para piano em Si Menor de Vivaldi. Lamentavelmente não encontrei este concerto para ligar a música ao texto. Vou colocar uma ária de Vivaldi para mim excelsa.
"25/12/48
Neste momento estou fascinada por uma das mais belas peças musicais que alguma vez ouvi - o Concerto para p[iano] em Si Menor de Vivaldi, da [editora] Cetra. Soria, com Mário Salerno. A música é ao mesmo tempo a mais maravilhosa e a mais viva de todas as artes - é a mais abstracta, a mais perfeita, a mais pura - e a mais sensual. Oiço com o meu corpo e é no corpo que se desperta o desejo em resposta ao entusiasmo e à emoção incorporado nesta música. É o eu físico que sente uma dor insuportável - e depois uma ânsia fátua - quando o mundo inteiro da melodia resplandece e depois cai como uma cascata na segunda parte do primeiro andamento - é carne e osso que morre um pouco de cada vez que sou engolida por este anseio do segundo andamento - "
Susan Sontag, Renascer, Diários e Apontamentos 1947-1963, Lisboa: Quetzal, 2010, p.23
Philippe Jaroussky, Vivaldi
Vedrò con mio diletto
l'alma dell'alma mia
Il core del mio cor pien di contento.
E se dal caro oggetto
lungi convien che sia
Sospirerò penando ogni momento...
[Ária do I acto da ópera Justino de Vivaldi, libretto de Nicolò Beregan. O libretto encontra-se na Biblioteca Nazionale di Torino]
Imagino que o David Rieff, o filho da Susan Sontag e responsável por esta edição, tenha tido algumas surpresas quando leu pela primeira vez alguns dos diários da mãe. De qualquer modo, foi uma mulher notável e livre que muito aprecio.
ResponderEliminarGostei desta explicação da música. Ando numa fase mais visual (nem sei porquê), mas concordo obviamente com esse dom da música de nos encher toda a alma.
ResponderEliminarBom dia!
Luís,
ResponderEliminarJulgo que sim. Deve ter tido grandes surpresas.
Concordo em absoluto quando diz que ela foi notável, está a encantar-me.
Margarida,
A música associada à imagem é algo de inexprimível porque pode levar-nos a uma espécie de extâse.
Bela introdução à música de Vivaldi. Continue!
ResponderEliminarAna, a sensibilidade à música não depende, nem da compreensão, nem da vontade. A harmonia e o ritmo actuam sobre não sei que terminações nervosas, que ligam directamente aos músculos (incluindo o coração) sem passar pelo cérebro. Tenho a certeza disso! ;-)))))
ResponderEliminarFilipe,
ResponderEliminarMuito obrigada pela sua visita e pelas suas palavras que, vindas de quem sabe tanto sobre música, são um verdadeiro estímulo.
Luísa,
Agradeço também a sua visita e vou pensar na ideia não cerebral e estritamente sensorial da música.
Tenho que reflectir... porque se a música está tão ligada à Matemática e à Lógica, como é que hei-de interpretar a sua afirmação?
Ana, não a conheço por isso desculpe a intrusão. Vim ter ao seu blog assim, ao acaso, nem me lembro como - mas esta peça musical, e o texto de Sonag, fizeram-me destemida. Queria agradecer-lhe o momento belíssimo que acabou de me proporcionar.
ResponderEliminarMaria Clara Paulino
Salvo erro é no «CASTELO DO BARBA AZUL» que G. Steiner fala da utilização da flauta de pan como o meio de chegar mais perto de Deus.
ResponderEliminarOs Jesuítas utilizavam muito a música através de flautas para se aproximarem dos autóctones no Brasil. Com imenso sucesso.
Bjs
Maria Clara Paulino,
ResponderEliminarAgradeço a sua visita e as suas palavras de agrado. Fico contente por ter partilhado algo de belo. Gosto muito de Jarousski e desta ária de Vivaldi, bem como do texto que também me tocou.
O sublime da música trouxe-a até aqui - bem-vinda!
A blogosfera tem isto de interessante comunicarmos sem nos conhecermos.
JPD,
ResponderEliminarQue bom ouvi-lo contar a história dos jesuítas, é uma história bonita e foi a magia da música a funcionar. Lembrou-me o meu querido Padre António Vieira.
Não li o livro que foca do Steiner mas vou tratar disso, aguçou-me a curiosidade. Obrigada por esta mais-valia.
Abraço!
Ressalvo: Jaroussky
ResponderEliminarNão sei responder-lhe, Ana. Mas note que, no nosso corpo, tudo funciona e reage vivamente aos movimentos (ritmos) pendulares e às harmonias «simétricas» (no sentido amplo de simetria), uns e outras naturalmente traduzíveis em termos matemáticos, geométricos ou lógicos. Somos mais resistentes à arte dissonante e às estéticas modernas da «desordem». A apreciação destas já requer uma «educação». ;-)
ResponderEliminarLuísa,
ResponderEliminarObrigada pela sua explicação. Concordo inteiramente no que diz respeito às reacções a "ritmos" "pendulares" e a "harmonias simétricas" e estéticas. A música joga com as sensações e com o estímulo que estas oferecem.
Só um "expert" na matéria pode ir para além da sensação.
Boa tarde! :)
Um belo equilibrio na assimetria
ResponderEliminardo corpo que luz
em sons
inteiros
Mar Arável,
ResponderEliminarObrigada pela sua aragem!