30/01/2012

O grito mudo

O tempo e o silêncio duas máximas que entram em casa pela porta do fundo.
Não há pressa deste lado da mesa mas os minutos passam rápidos, os ponteiros não se coibem.
A estante vazia enche-se da poeira que teima em cair. Afasto-a e nela registo a minha mão como um desenho infantil, o nome, a palavra ou o conceito que prendo entre o ranger dos dentes. O grito mudo.






Detalhe de Fonte Bicéfala, século XVI (1501-1515), oficina de Lisboa, Museu Nacional de Arte Antiga.

28/01/2012

"Grito!" - José Gomes Ferreira

Seteira castelo de Beja



Grito!
Mas as pedras dormem, dormem
no vale anoitecido
onde paira o Silêncio antes do Homem
- e dos búzios encostados ao ouvido.


Poemas de José Gomes Ferreira num CD - Grito in Província - 1945 -
dito por Sofia Sá da Bandeira e com música original de Bernardo Sassetti.



Hoje é um grito sereno, de contentamento...
Encontrei uma grafia que me disse muito.

27/01/2012

Uma mão cheia de coisas

Um dia eu disse que nunca ninguém leu a minha mão. Umas amigas leram virtualmente e ofereceram a sua poesia.

[A ordem foi tirada à sorte]

La Bonne Aventure (A boa-sorte )
Jacques-Louis David - 1824

Terás sorte e serás feliz.
Primeiro acredita em tí,
segundo crê nos céus,
e terceiro por fim,
mantenha a fé na terra.

Terás sorte porque receberás flores,
as vezes até os canteiros as trazem,
mas não a vemos ... veja ... são flores, terás sorte.
Serás feliz, pois aprenderá com os anos a enxergá-la,
... do teu lado direito o sol, do esquerdo a lua, no meio as estrelas;

Se tens olhos vê,
se tens pés, ande,
se tens mãos, abrace,
se tens dentes, sorri,
se tens boca, constroi;

pois teu coração foi forjado no fogo dos anos e teus sentimentos lavados nas pérolas do rio.

Creia,
és feliz,
creia,
tens sorte.
Só os grandes repensam suas vidas e acertam seus passos, procuram os caminhos e se dislumbram com as estrelas no céu. Só os grandes reorganizam seus sentimentos de modo a sempre se acharem pequenos e ainda distantes do céu. Só grandes mulheres respiram sensibilidade através dos poros.
Terá boa sorte a mão que demarca a construção de um mundo novo ... vês? Ès feliz ... tens sorte e temos nós também, por tê-la.

poema e imagem de Cozinha dos Vurdóns.

Como Um Cipreste

Se eu fosse uma árvore
queria ser um cipreste.

Sob o luar
Doce e manso
Num contraste
Forte e seguro
Ergue-se o cipreste.

Olho-o.

Cresce
Em direcção ao céu
Numa rectidão
que nada perturba.

Sabe quem é.
Sabe o que quer.

Firme
Sereno
Seguro
Leal


...um cipreste...

Fotografias e poema da Isabel - Palavras Daqui e Dali

A Isabel sabe que adoro ciprestes.






Da Cláudia Ribeiro - Livraria Lumière

"Um bom livro é um legado precioso que o autor faz à humanidade"
Addison*

"A arte é uma flor nascida no caminho da nossa vida e que se desenvolve para suavizá-la".
Schopenhaeur *

*in Almanaque Bertrand, 1961, p. 67. E ainda os Queen que adoro!




Da Alexandra Ribeiro- Livraria Lumière

Feliz Aniversário

Alguma coisa está acontecendo,
olhei para o céu, cadê as estrelas???
o sol sumiu;
a lua partiu.........

Sumiram as rosas dos jardins,
Sumiram os peixinhos do mar,
E vento deve estar soprando em outro lugar......

Em busca de ajuda,
procurei os anjinhos,
e nem eles consegui encontar.
Quando de repente um deles,
eu vi tentando escapar.......

Não exitei, e fui logo perguntando:
Anjinho, anjinho: -O que está acontecendo???
E o anjinho mesmo que apressado,
respondeu ao meu chamado:
-Meu rapaz, você não tem do que se preocupar,
todos saíram para comemorar,
o aniversário da pessoa mais linda.......deste lugar......

Fernando Finatti

A todas muiiiiiiito obrigada!

24/01/2012

Para todos!

Grata a todos! Espero que os "anjos" cantem no Céu para Vós por me fazerem feliz, num dia especial!


"Dos Anjos, diz-se que cantam no Céu... Nós andamos a ensaiar na terra, para cantar com eles no Céu. Mas um pouco do Céu já se ouve, quando vós cantais."

Papa Paulo II, dirigindo-se aos Antigos Orfeonistas (do Orfeon Académico de Coimbra) na Basílica de S. Pedro, Junho de 1996.

Chegou-me através de mão amiga.

23/01/2012

In Memoriam

Os Portugueses dos séculos XV e XVI provaram pela experiência e pela dedução científica que o mundo equatorial era habitável e habitado.*


Fig. 19 da História de Portugal de A. H. de Oliveira Marques, Lisboa: Palas Editora, 1976 (6ª edição).



* A Terra habitada e as zonas inabitáveis, segundo o Tratado da Esfera, de Sacrobosco, século XIII.

O Professor Oliveira Marques faleceu a 23 de Janeiro de 2007. Foi e é o mentor da História e da Cultura portuguesas para muitos estudantes e para os apaixonados pela História das nossas raízes.


Observando a imagem, pergunto-me se o mundo equatorial não será agora mais desejável que o nosso país?

22/01/2012

A natureza humana - "O Deus da Carnificina"

Quem somos?


Num espelho invertido, tiramos a máscara, olhamo-nos. Descobrimos a pele e os músculos tensos que desfiguram o sorriso num leve esgar. Os olhos abrem e fecham-se. A pele enruga-se contraída entre o sofrimento e a raiva, a civilidade e a brutalidade. As pérolas perdem o brilho, Kokoschka amarelece. Afinal a carne esquece Deus e a moral esvai-se...



Depois de ver:

O Deus da Carnificina de Roman Polanski, com Jodie Foster, Kate Winslet, Christoph Waltz e John C. Reilly. E ainda a especial participação de Elvis Polanski, filho do realizador.



20/01/2012

Chave

Há dias em que a concha se devia fechar e o sono ganhar à insónia.


A porta está fechada e a chave perdida num mar de ilusões.


Perdeu-se a pérola no fundo do oceano e as sereias em silêncio aguardam as naus que não chegam.


Será sob a lua crescente que a noite se tornará dia?



Detalhe de uma porta em Toledo


17/01/2012

Miguel Torga - "Oração"




Aguarela de Manuel Tavares, O Mártir da Cruz, 1958. Colecção Carlos do Carmo.



Retirado do livro de Fernando Tordo e Manuel de Sousa, As Cores da Crucificação, Lisboa: Oro Faber, 2005, p. 170.
Fotografia - Pedro Saraiva

Adolfo Correia da Rocha, Miguel Torga, faleceu a 17 de Janeiro de 1995. A minha homenagem a um homem que passou pelo mundo com a discrição de um gentleman.





Coimbra, 14 de Julho de 1974

ORAÇÃO

Peço-te lucidez, Senhor.
Rogo-te humildemente,
Em nome da terrena condição,
Que me não cegues neste labirinto
De paixões.
Que nele, aos tropeções,
Eu nunca chegue até onde, perdido,
O homem já não pode
Saber até que ponto é consentido
O jugo que sacode.

Miguel Torga, Diário XII, Coimbra, (2ª edição) p. 73.



Agradeço a Cláudia da Livraria Lumière que me recordou o poeta, escritor e ensaísta.

14/01/2012

Discurso estéril - Alçada Baptista

Detalhe de O Desterrado, Soares dos Reis, 1872


Museu Soares dos Reis, Porto




Tenho que retomar o peso e a medida da palavra humana, quanto mais não seja para dizer com clareza que estamos a matar as almas à custa de pôr o homem a falar em voz alta e a fazê-lo viver desse discurso estéril. Que estamos a cair numa astenia geral, numa sociedade de fantasmas que, à custa de dizer palavras perderam a linguagem do ser. Gostaria de tentar redescobrir as ribeiras subterrâneas e as orações secretas que se diziam baixinho, as meias palavras que evocavam o estofo misterioso do tempo, as palavras segregadas dos amantes que comunicavam talvez a pulsação do cosmos, talvez a linguagem e o silêncio de Deus.

António Alçada Baptista, Os Nós e os Laços, Lisboa: Editorial Presença, 1985, p. 127.

12/01/2012

Através dos seus olhos

Olhar, Festa de S. Francisco Xavier, Old Goa




(...) um olhar duma imensa inocência sobre o mundo. Através dos seus olhos, tudo parecia bom...
António Alçada Baptista, Os Nós e os Laços, Lisboa: Editorial Presença, 1985, p. 97.



Pena é perder-se o olhar!

O virtuosismo de Jeff Beck




10/01/2012

Nu

Reflexão depois de ler um livro que comprei na Livraria Lumière sobre Inês de Castro.


Paulo Ferreira, (Lisboa, 1911-1999)

Desenho a tinta da china e aguarela, altura: 22,5; largura: 34cm, Museu do Chiado – Museu Nacional de Arte Contemporânea. Lisboa



Nu feminino deitado numa cama, de frente, cabelo apanhado atrás, com o cotovelo direito assente numa cómoda, baixando o olhar para o lado esquerdo, e com um bandolim encostado no fundo. (Retirado da Matriznet).




"Um grande amor nunca é espontâneo".

Agustina Bessa-Luís, Adivinhas de Pedro e Inês




Talvez a Agustina tenha razão.... Será?
Do amor tantos poetas, escritores, pintores, cantores, filósofos... escreveram, desenharam, meditaram, cantaram. Porém, ninguém consegue apreender totalmente a essência dessa palavra. Há uma certa impossança em abraçar o vocábulo. Terá Pedro vislumbrado a essência em Inês?


Placido Domingo - Tosca - E lucevan le stelle

07/01/2012

Florescência



Uma janela é uma obra de arte. Dela podemos ver a natureza que cresce num acaso ordenado. Podemos ver o horizonte e ficar à espera de uma saudação!



As buganvílias estavam em florescência apesar do Outono adiantado.


Janela do Museu Soares dos Reis, Porto



02/01/2012

A Torre

Abro este ano com a Torre da Universidade de Coimbra. Um local muito especial para mim. Tenho revisitado muitas vezes este Paço das Escolas.
Não sei se este ano novo poderei vir ao blogue com regularidade. Sei de antemão que vou ter saudades de quem me tem acompanhado. Sei que terei o impulso de escrever alguma nota, colocar algum poema, música, arte ou algo que me toque para partilhar com todos. Mas esta torre com história, que podem ver no link assinalado, vai ter que organizar o meu tempo. Assim, o primeiro foco de intenções para este ano é que as horas se tornem mais organizadas.




Em especial para o Pedro, "o bar do Direito", um pouco renovado.




A Torre é uma peça maior do xadrez por ganhar importância estratégica, principalmente na fase final do jogo. O desenho abaixo retrata ao que parece a primeira torre do jogo de xadrez.



Desenho retirado de um relevo egípcio - Hittite Chariot







«Uma das lendas que acompanham a criação do jogo conta que o brâmane Sissa criou o chaturanga, predecessor mais antigo do xadrez, tomando por base as figuras do exército indiano e incluiu a Biga, um carro de guerra movido por cavalos muito comum na época*. O movimento desta peça era idêntico ao da atual torre, o seu nome em sânscrito era Ratha. De acordo com relatos gregos, esta era a composição do exército indiano desde o Séc. IV a.C.»

Ler mais aqui wikipédia , *Lasker (1999), pp.29, 30.

A segunda intenção é fazer um retiro e cavalgar para vencer o jogo em que se torna a nossa vida. A terceira que todos estejam presentes mesmo na minha ausência.

Recebi um livro no Natal, para juntar à coleção de mini-livros, do qual transcrevo:
(...) dêem-me um amigo, no meu retiro, a quem possa murmurar: A solidão é doce!


William Cowper (1731-1800) in Um Amigo, Helen Exley, Editorial Estampa

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