04/11/2010

"Oiço com o meu corpo"!

VIVALDI: Portrait d’un violoniste vénitien du XVIIIe siècle, par François Morellon de La Cave (1723), généralement considéré comme étant celui de Vivaldi Museo internazionale e biblioteca della musica (Bologna)


A música joga com as sensações, eleva-nos o estado da alma - vibrar ao som da música - é uma expressão que ouço desde pequena.
Susan Sontag escreveu este apontamento no momento em que estava a ouvir um Concerto para piano em Si Menor de Vivaldi. Lamentavelmente não encontrei este concerto para ligar a música ao texto. Vou colocar uma ária de Vivaldi para mim excelsa.

"25/12/48

Neste momento estou fascinada por uma das mais belas peças musicais que alguma vez ouvi - o Concerto para p[iano] em Si Menor de Vivaldi, da [editora] Cetra. Soria, com Mário Salerno. A música é ao mesmo tempo a mais maravilhosa e a mais viva de todas as artes - é a mais abstracta, a mais perfeita, a mais pura - e a mais sensual. Oiço com o meu corpo e é no corpo que se desperta o desejo em resposta ao entusiasmo e à emoção incorporado nesta música. É o eu físico que sente uma dor insuportável - e depois uma ânsia fátua - quando o mundo inteiro da melodia resplandece e depois cai como uma cascata na segunda parte do primeiro andamento - é carne e osso que morre um pouco de cada vez que sou engolida por este anseio do segundo andamento - "
Susan Sontag, Renascer, Diários e Apontamentos 1947-1963, Lisboa: Quetzal, 2010, p.23

Philippe Jaroussky, Vivaldi


Vedrò con mio diletto
l'alma dell'alma mia
Il core del mio cor pien di contento.
E se dal caro oggetto
lungi convien che sia
Sospirerò penando ogni momento...



[Ária do I acto da ópera Justino de Vivaldi, libretto de Nicolò Beregan. O libretto encontra-se na Biblioteca Nazionale di Torino]

15 comentários:

  1. Imagino que o David Rieff, o filho da Susan Sontag e responsável por esta edição, tenha tido algumas surpresas quando leu pela primeira vez alguns dos diários da mãe. De qualquer modo, foi uma mulher notável e livre que muito aprecio.

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  2. Gostei desta explicação da música. Ando numa fase mais visual (nem sei porquê), mas concordo obviamente com esse dom da música de nos encher toda a alma.
    Bom dia!

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  3. Luís,
    Julgo que sim. Deve ter tido grandes surpresas.
    Concordo em absoluto quando diz que ela foi notável, está a encantar-me.

    Margarida,
    A música associada à imagem é algo de inexprimível porque pode levar-nos a uma espécie de extâse.

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  4. Bela introdução à música de Vivaldi. Continue!

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  5. Ana, a sensibilidade à música não depende, nem da compreensão, nem da vontade. A harmonia e o ritmo actuam sobre não sei que terminações nervosas, que ligam directamente aos músculos (incluindo o coração) sem passar pelo cérebro. Tenho a certeza disso! ;-)))))

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  6. Filipe,
    Muito obrigada pela sua visita e pelas suas palavras que, vindas de quem sabe tanto sobre música, são um verdadeiro estímulo.



    Luísa,
    Agradeço também a sua visita e vou pensar na ideia não cerebral e estritamente sensorial da música.
    Tenho que reflectir... porque se a música está tão ligada à Matemática e à Lógica, como é que hei-de interpretar a sua afirmação?

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  7. Ana, não a conheço por isso desculpe a intrusão. Vim ter ao seu blog assim, ao acaso, nem me lembro como - mas esta peça musical, e o texto de Sonag, fizeram-me destemida. Queria agradecer-lhe o momento belíssimo que acabou de me proporcionar.

    Maria Clara Paulino

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  8. Salvo erro é no «CASTELO DO BARBA AZUL» que G. Steiner fala da utilização da flauta de pan como o meio de chegar mais perto de Deus.

    Os Jesuítas utilizavam muito a música através de flautas para se aproximarem dos autóctones no Brasil. Com imenso sucesso.

    Bjs

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  9. Maria Clara Paulino,
    Agradeço a sua visita e as suas palavras de agrado. Fico contente por ter partilhado algo de belo. Gosto muito de Jarousski e desta ária de Vivaldi, bem como do texto que também me tocou.
    O sublime da música trouxe-a até aqui - bem-vinda!
    A blogosfera tem isto de interessante comunicarmos sem nos conhecermos.

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  10. JPD,
    Que bom ouvi-lo contar a história dos jesuítas, é uma história bonita e foi a magia da música a funcionar. Lembrou-me o meu querido Padre António Vieira.

    Não li o livro que foca do Steiner mas vou tratar disso, aguçou-me a curiosidade. Obrigada por esta mais-valia.

    Abraço!

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  11. Não sei responder-lhe, Ana. Mas note que, no nosso corpo, tudo funciona e reage vivamente aos movimentos (ritmos) pendulares e às harmonias «simétricas» (no sentido amplo de simetria), uns e outras naturalmente traduzíveis em termos matemáticos, geométricos ou lógicos. Somos mais resistentes à arte dissonante e às estéticas modernas da «desordem». A apreciação destas já requer uma «educação». ;-)

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  12. Luísa,
    Obrigada pela sua explicação. Concordo inteiramente no que diz respeito às reacções a "ritmos" "pendulares" e a "harmonias simétricas" e estéticas. A música joga com as sensações e com o estímulo que estas oferecem.
    Só um "expert" na matéria pode ir para além da sensação.
    Boa tarde! :)

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  13. Um belo equilibrio na assimetria

    do corpo que luz

    em sons

    inteiros

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  14. Mar Arável,
    Obrigada pela sua aragem!

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