31/12/2015

Do Ano Velho para o Ano Novo, com afectos

Começo por agradecer as palavras de Boas Festas de que os cartões são mensageiros. 
Talvez seja vaidade mostrar alguns dos presentes que me tocaram; porém, o que me levou a fazê-lo foi a forma de agradecer o afecto e a lembrança. Começando da esquerda para a direita: nunca bebi um chá de jasmim tão bom; o calendário de Yara Kono tem ilustrações lindíssimas; o Porto de Resende tem o seu traço e cores inconfundíveis; 36 desenhos de Chagall chegaram com uma gaivota e nada mais é preciso dizer; seguem-se os lindíssimos menús reunidos numa "História das Artes de Servir à Mesa"; a que se juntam a "biografia de Ilse Losa" por quem tenho especial curiosidade e as "Dicas para tudo e mais alguma coisa" numa fabulosa edição retro. Para último, deixei de propósito duas figuras em miniatura oferecidas para a minha casa de bonecas. O anjinho, em particular, emocionou-me pois chegou o Natal à dita casa que um dia trarei aqui. 


Coloquei as peças ao lado da chávena para poder-se observar a escala

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Este ano a minha árvore de Natal esteve quase sempre inclinada. As decorações foram caindo e não tentei acender as gambiarras. Porque será?



Desejo a todos 
um

FELIZ ANO NOVO

cheio de projectos

e alegria!


29/12/2015

Da ilusão

O sofá em frente ao estúdio.


Ilusão - Definição:

Do latim illudere. Engano dos sentidos perante determinada aparência da realidade. A ilusão constitui-se pela afectação e consequente manipulação dos sentidos, de forma a velar e/ou deturpar a realidade.

Dicionário de Estética,  (org: Carchia, Gianni e outro, col, Lexis),  Lisboa: Edições 70, 2003.

A ilusão da realidade é parte integrante da consciência e é a consciência que não permite que essa mesma ilusão destrua a verdadeira noção de realidade.

Edgar Morin,   O cinema ou o homem imaginário. Lisboa: Relógio d’ Água, 1997.

Partindo da etimologia da palavra até à filosofia do termo, duma abordagem mais técnica para uma abordagem literária e sensorial, é esta última que escolho:  "Construímos estátuas de neve e choramos ao ver que derretem" (Walter Scott).

Mea culpa, cria-se a ilusão, a ideia do inexistente, como se o mundo pudesse ser feito de desejos e moldado segundo a nossa vontade. 
Assim, nos campos não faltariam flores, a Primavera seria eterna, a chuva só duraria uns minutos, o sorriso seria imenso e o choro limitado. Não haveria medo, apenas confiança, as mãos não estariam vazias mas repletas de júbilo. Enfim, as estátuas de neve não derreteriam...


27/12/2015

Uma pequena roseira

Uma pequena roseira, uma porta verde, um candeeiro, um arranjo nada tradicional. Contudo, teve o condão de me tocar quando passeava pelas ruelas do castelo de Ourém. Parei, contemplei. A pequena roseira levou-me até ao livro que ando a ler. O livro é um relato de viagens, uma viagem à Ásia realizada por Maugham. Nele, o escritor foca uma personagem que regressa a sua casa em Inglaterra, a um jardim com rosas.
O meu pequeno passeio nada tem a ver com a viagem ao Oriente mas é também uma viagem; a coincidência entre a viagem à paisagem circundante e ao interior de nós próprios é um acaso feliz. 
A vida acaba por ser isto um conjunto de acasos, coincidências, desvios, caminhos percorridos, uns felizes, outros menos felizes... 


«Muito havia para dizer a mim mesmo sobre a arte e a vida, mas as minhas ideias estavam todas misturadas, como os objectos de uma velha loja de quinquilharias, e nunca sabia onde encontrá-las quando precisava delas. Estavam nos recantos da minha cabeça como bugigangas arrumadas no fundo das gavetas de uma cómoda, e eu sabia apenas que elas lá se encontravam. (...) Seria agradável limpar o pó, arrumar tudo em prateleiras, ordenado e catalogado de modo que eu soubesse em que consistiam as minhas existências. Decidi que, enquanto percorria aquela região, faria uma limpeza profunda de todas as minhas ideias.»

Somerset Maugham, Um Gentleman na Ásia, Relato de uma Viagem de Rangum a Haiphong [editado. 1930], (trad. Raquel Mouta). Lisboa: Tinta da China, 2013, p. 64-65.



A todos agradeço o afecto que deixaram nesta quadra Natalícia.

23/12/2015

Estrela de Natal !

A escultura de F. Marques torna-se num presépio humano, escultórico, com a colocação da estrela que marca o caminho para visitar o Menino.  Em França o Menino Jesus só é colocado no dia de Natal.

Feliz Natal!

Vista parcial da escultura de F. Marques, Ao Povo de Ourém, 800 anos de História, 1982
Jardim de Plessis-Trévise,  Ourém



Coro do King's College, Cambridge

21/12/2015

Palavras para quê?

Ourém, Castelo de Ourém,intramuros

Inunda-se de alegria o coração
como se a Primavera estivesse a despontar.
A chuva parece distante...
e o sol apesar de fraco
emana uma luz intensa e quente.
Palavras para quê?


19/12/2015

Religiosidade

Sagrada Família


A figura mais perfeita e mais capaz de quantas inventou a natureza e conhece a geometria é o círculo. Circular é o globo da terra, circulares as esferas celestes, circular toda esta máquina do universo, que por isso se chama orbe, e até o mesmo Deus, se sendo espírito pudera ter figura, não havia de ter outra, senão a circular.

Padre António Vieira, "Sermão de Nossa Senhora do Ó Na Igreja de Nosssa Senhora da Ajuda, Bahia (1640)", in Obras Completas, Sermões, vol. II - tomos IV, V e VI, Porto, Lello &; Irmão, 1959, págs. 435 – 450.

14/12/2015

A beleza será então a fuga possível.

Por vezes precisamos simplesmente da beleza para esquecer os momentos que nos entristecem: como o terrorismo, a violência ou o a imposição pelo medo - o poder dos cobardes.
O cansaço também leva à procura da beleza.
A beleza será então a fuga possível.


Autor desconhecido, detalhe, Devaneio, século XIX




12/12/2015

O POEMA É UM CUBO...




O POEMA É UM CUBO DE GRANITO

O poema é um cubo de granito,
Mal talhado, rugoso, devorante.
Roço com ele a pele e o negro da pupila,
E sei que por diante
Tenho um rasto de sangue à minha espera
No caminho dos cães
Em vez da primavera.

 José Saramago, Provavelmente Alegria, Lisboa: Caminho, 1985.


Uma caixinha de música sempre me fez lembrar um cubo mágico
daí o trocadilho: Flauta Mágica, ouça-se e veja-se Papagena, Papageno.

09/12/2015

A mesa junto à janela

A mesa junto à janela



A mesa junto à janela é muitas vezes companheira de reflexão. O mármore branco de forma hexagonal infere alguma pureza ao conjunto de estilo holandês, pesado e sóbrio.
Dois candelabros jogam no espaço cénico a verticalidade dos sentidos. A luz é a grande vencedora, projecta as sombras, dilui os pensamentos. 
O sabor do café solitário, o olhar vazio para a rua iluminada leva a pensamentos cruzados, à informação partilhada. 
Um grito mudo de impotência. A desordem nascida do improvável, a derrota dos frágeis, incoerência anunciada, a queda de Ícaro num campo sem flores.
A barca é pequena e o homem do leme perde as referências básicas, perde o nome que encerra em si.
Perde-se...
O nó desata-se, o fio desfia-se, o tear desconhece a mão que vagarosamente quer tecer o fio.



Em re-re-reposição.

05/12/2015

O que tentam dizer as árvores





Árvores

O que tentam dizer as árvores
No seu silêncio lento e nos seus vagos rumores,
o sentido que têm no lugar onde estão,
a reverência, a ressonância, a transparência,
e os acentos claros e sombrios de uma frase aérea.
E as sombras e as folhas são a inocência de uma ideia
que entre a água e o espaço se tornou uma leve
integridade.
Sob o mágico sopro da luz são barcos transparentes.
Não sei se é o ar se é o sangue que brota dos seus
ramos.
Ouço a espuma finíssima das suas gargantas verdes.
Não estou, nunca estarei longe desta água pura
e destas lâmpadas antigas de obscuras ilhas.
Que pura serenidade da memória, que horizontes
em torno do poço silencioso! É um canto num sono
e o vento e a luz são o hálito de uma criança
que sobre um ramo de árvore abraça o mundo.


António Ramos Rosa, Cada árvore é um ser para ser em nós, 2002


03/12/2015

"como câmara de eco"

Talbot Hughes, ECHO, 1900, daqui


Ninguém espera de nós a solução de um problema, o consolo de um bom conselho, a conclusão feita da experiência. Todos nos querem usar como câmara de eco da sua completa solidão e ouvi-los é apenas estar ali como uma espécie de espelho que lhes devolve o movimento dos lábios, mas não o som que eles emitem.A vida é um filme mudo, às vezes a cores, mas mudo, irremediavelmente mudo.

António Mega Ferreira, A Blusa Romena. Lisboa: Sextante, 2008, p 212.

 

01/12/2015

É possível que todos os livros sejam inúteis...


Leituras e livros  em homenagem ao poeta maior:

80 Anos da morte de Fernando Pessoa, dia  30 de Novembro de 2015

A escultura “Hommage a Pessoa”, de Jean-Michel Folon, foi inaugurada no 120º aniversário de nascimento do poeta, Largo Teatro S. Carlos


É possível que todos os livros sejam inúteis, se lemos para nos esquecermos de nós, para debelarmos a ferida de existir. Se formos previdentes, os livros também nunca nos magoam. Salvem-se de ler Kafka de madrugada, ou Virgínia Woolf se estiverem internados com uma prancreatite. As pesssoas, sim, essas magoam-nos: são uma dádiva mas também agravam a nossa ferida, escarafuncham nela e fazem-na sangrar.


[sublinhado por mim].

João Tordo, O Paraíso Segundo Lars D. Lisboa: Companhia das Letras, 2015, p. 15


Comecei a ler o Paraíso Segundo Lars D. de João Tordo sem ler duas obras que a antecedem: Biografia involuntária dos amantes e Luto de Elias Gro
Talvez fosse importante ter lido os outros livros mas estou a ter um imenso prazer e deleite na leitura deste Paraíso. 
Como primeiro livro que leio não sinto a falta dos outros. A narrativa prende, as palavras tocam-me profundamente porque são cheias de conteúdo. As ideias não são novas mas estão escritas pela primeira vez como súmula categórica.

João Tordo é filho do cantor Fernando Tordo, é licenciado em Filosofia e estudou escrita criativa em Londres e Nova Iorque. Venceu o Prémio Literário José Saramago (2008) com a obra: "Três Vidas".

Vou ler mais livros deste escritor pois estou a gostar da amostra. 





1º de Dezembro - outrora era feriado em nome dos 40 conjurados que restauraram a independência nos idos de 1640.
Recorde-se assim, a data mesmo sem festa. 

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