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Fala do Velho do Restelo ao Astronauta
Aqui, na Terra, a fome continua,
A miséria, o luto, e outra vez a fome.
Acendemos cigarros em fogos de napalme
E dizemos amor sem saber o que seja.
Mas fizemos de ti a prova da riqueza,
E também da pobreza, e da fome outra vez.
E pusemos em ti sei lá bem que desejo
De mais alto que nós, e melhor e mais puro.
No jornal, de olhos tensos, soletramos
As vertigens do espaço e maravilhas:
Oceanos salgados que circundam
Ilhas mortas de sede, onde não chove.
Mas o mundo, astronauta, é boa mesa
Onde come, brincando, só a fome,
Só a fome, astronauta, só a fome,
E são brinquedos as bombas de napalme.
José Saramago
Lindo o poema. Tenha pena que Saramago tenha morrido.
ResponderEliminarTambém me fez impressão.
ResponderEliminarGosto de alguns dos seus livros e da atitude polémica que por vezes assumia.
Hoje é um dia de lamento... :(
ResponderEliminarTem razão Sara, é sempre triste ver quem eleva Portugal ir-se embora.
ResponderEliminarCara Ana, felicito-a pela inclusão de um poema. Frequentemente, esquece-se que a produção literária de Saramago transcendeu o romance. Começou, aliás, na poesia e passou também pelo teatro. Sou apologista de que se (re)lembre as grandes obras e grandes vidas. E esse poderá constituir um dos nossos (dos portugueses) maiores tributos.
ResponderEliminarAbraço e bom fim-de-semana.
Obrigada R,
ResponderEliminarDescobri-o como poeta há pouco tempo e essa faceta está a deixar-me fascinada.
Abraço e desejo também que o fim-de-semana seja óptimo!