Um dos últimos livros de poesia que li começa com uma dedicatória também ela um verdadeiro poema. Transcrevi parcialmente, pois não coloquei os nomes. Apesar de ser uma homenagem pública, não quis transpor as fronteiras da
privacidade gravada no livro. Os nomes são nomes e esses são intocáveis.
privacidade gravada no livro. Os nomes são nomes e esses são intocáveis.
São quatro os livros que escoram a biblioteca que
tenho dentro da cabeça. São os meus livros mais
valiosos.
Nas suas folhas sempre abertas deposito alguns
farrapos de nuvens e a máquina frágil do meu coração.
[aos pais]
por todas as palavras e pela aprendizagem do silêncio
[aos avós]
pelas janelas abertas para os quintais e pelas
raízes que as suportam.
Livro IV
Os lírios são livros
Os livros lêem-se com o tronco
inclinado sobre as mãos. Descem as mãos sobre
as palavras só depois poisamos sobre o poema. São
dois movimentos sucessivos no movimento
circular do mundo
sobre o livro fechado
e sobre o livro aberto.
Para subir depois ao cume das palavras o
movimento deve ser contrário: de cima Rick Beerhorst *
para baixo. Também a noite declina para ascender
à luz e todos os rios descem em direção à primeira
nascente. E os corpos também se movem
sempre se moveram
em espirais descendentes
para subir as torrentes de lava que os atravessam.
Lê-se então o livro com a lenta respiração das
mãos. No tremor das mãos sibila o interior do
mundo. Também os lírios são livros
que se abrem à luz de todas as manhãs, perfumes
brancos densos vapores que se elevam da terra
escura. E vamos devagar por dentro da raiz das
coisas
e vamos devagar porque o tempo não conta
é tempo transmutado em luz
e o que é eterno desconta nos cálculos do tabelião
da morte.
Depois de fechar o livro lê-se o livro por mais três
meses seguidos. Espera-se que chegue a magia do
esquecimento. Espera-se que acordem as divinas
criaturas e
derramem lágrimas e leite
e que os homens ponham a funcionar as líquidas
máquinas circulares.
Dos livros brotarão lírios
e dos lírios brotarão livros
e sabe-se que em toda a sua glória nunca salomão
se vestiu assim: do mais puro metal das palavras,
do ouro das coisas mais puras, do fulgor dos rios
eternos, dos luzentes rios
que ligam o céu e a terra.
Rui Miguel Fragas, Não sei se o Vento.Óbidos: Poética Edições, 2015, p. 73-74
*Daqui
Antes de comentar, quero ler e reler !
ResponderEliminarPode demorar uns dias.
" e vamos devagar porque o tempo não conta "
Um beijo.
Beijinho.:))
EliminarEstou a ler O Tambor de Lata de Gunter Grass.
ResponderEliminarE estou a gostar muito.
Como gosto muito de Peter Gabriel.
Beijinhos
Ainda não li esse título mas gosto da escrita dele.
EliminarBeijinho.:))
Poesia pela manhã é um bom antídoto :)
ResponderEliminarObrigada, bea.
EliminarBoa noite.:))
Gostei muito. Obrigada, Ana! :-)
ResponderEliminarObrigada, Margarida.
EliminarUm beijinho.:))
Ia dizer que não sabia do que mais gostava: do poema? Da dedicatória?
ResponderEliminarLi. Reli. Conclui.
Opto pela dedicatória. Um mundo com gente, e afectos, e amor, e sabedoria.
Lindo o quadro. Peter Gabriel sempre tão agradável de se ouvir.
A Ana, e a partilha da beleza sempre conjugada numa harmonia perfeita.
Um grande obrigada.:)
Beijinho
GL,
EliminarA dedicatória é linda.
Fiquei apaixonada por ela e os 4 livros correspondentes aos pais, à avó materna e ao avô paterno é de uma beleza enorme.
Beijinho.:))
Fiquei com imensa vontade de conhecer Rui Miguel Fragas. A amostra deixada é um convite a isso mesmo.:)
EliminarEstão os quatro livros à venda? Vou tentar encontrá-los.
Bom Domingo.
Beijinho, Ana.
GL,
EliminarNeste momento estão dois, os 4 livros estão na cabeça dele - dedicatória (pais avó materna e avô paterno).
Vai sair um terceiro que ganhou um prémio literário de poesia na Universidade de Aveiro.
Só hoje reparei no seu comentário.
Beijinho. :))
Sim, sim, tem razão! Numa primeira abordagem tinha ficado com a sensação que eram 4 os publicados, precisamente contando os dedicados aos pais, avó materna e avô paterno.:(
EliminarUma questão matemática, nada mais.
Vou ver o que existe dele na Fnac ou na Bertrand.
Obrigada, Ana.
Beijinho
Sim, sim, tem razão! Numa primeira abordagem tinha ficado com a sensação que eram 4 os publicados, precisamente contando os dedicados aos pais, avó materna e avô paterno.:(
EliminarUma questão matemática, nada mais.
Vou ver o que existe dele na Fnac ou na Bertrand.
Obrigada, Ana.
Beijinho
GL,
EliminarEm Lisboa encontra só na Livraria Ler Devagar e na Férin.
Também podem ser pedidos online, sem custos adicionais de envio, pelo preço normal, neste endereço da editora
http://poetica-livros.com/loja/index.php?route=product%2Fproduct&product_id=426
O autor
«Em alguns casos, peço à editora que me mande exemplares e com o desconto que me faz permite-me enviá-los por correio, pelo preço normal. »
Só assim conseguirá GL. Penso que irá gostar.
Um beijinho. :))
~~~ Rui Fragas é, de facto, um poeta de rara sensibilidade,
ResponderEliminar- sabe o nome das árvores e entende a voz do mar e do vento...
~~~~~~ Leitura muito agradável e .uma voz admirável .~~~~~~
~~~~~~~~~~ Beijinhos. ~~~~~~~~~~.
Majo,
EliminarConcordo.
Beijinhos. :))
Também já li e reli tudo...
ResponderEliminarA dedicatória sem dúvida é muito bonita e poética!
Repleta de sentimento.
Gostei do poema, sobre livros e lírios...
Um beijinho.:))
Obrigada, Cláudia.
EliminarLembrei-me de si quando li este poema. Foi um dos que mais gostei.
Beijinhos. :))
Continuo sem comentar.
ResponderEliminarMais uns dias até acalmar.
Um beijo amigo.
João,
EliminarDesejo que se instale calmamente.
Beijinho.:))
Sublime o poema de Rui Miguel Fragas. Gostei a valer.
ResponderEliminarA leitura tem uma liturgia própria e uma anatomia. O poeta faz aqui a sua enunciação simbólica e imagética de forma magistral.
A Ana harmoniza todo trabalho com a habitual habilidade (competência) e bom gosto.
BFS
Agostinho,
EliminarEste é o segundo livro do Rui Féteira, Rui Fragas é pseudónimo. Vai sair um terceiro que ganhou um prémio no concurso de poesia da Universidade de Aveiro.
Qualquer dia coloco qualquer coisa do primeiro livro.
Obrigada pela sua gentileza. :))
BFS