30/06/2017

"O processo eterno e constante"



- É a vida que importa, nada senão a vida: o processo da descoberta - o processo eterno e constante (...), e não a própria descoberta.

Virginia Woolf, Noite e Dia ( 1919). Lisboa: Relógio d'Água, 2012 p.121.

Agradeço à Isabel que me ofereceu este livro.


A minha homenagem a Victor Hugo com a projecção do excerto do filme: Os Miseráveis, dirigido por Tom Hooper.

23/06/2017

Corta-papéis

Um dos poucos corta-papéis que faz parte da minha colecção. Adquiri-o numa feira de velharias. Gosto particularmente dele por ser uma flor e ter um movimento súbtil. Julgo que será Arte Nova. 
Já foi usado para cortar folhas de livros e algumas cartas, na era dos ebooks e da informação global que, apesar disso, não dispensam o papel e o correio.
Do quotidiano e da Arte eis o 
                                                     Corta-papéis



"TODA A ARTE É DIZER QUALQUER COISA"

Outra nota ao acaso

Toda a Arte é uma forma de literatura, porque toda a arte é dizer qualquer coisa. Há duas formas de dizer - falar e estar calado. As artes que não são a literatura são as projecções de um silêncio expressivo. Há que procurar em toda a arte que não é a literatura a frase silenciosa que ela contém, ou o poema, ou o romance, ou o drama. Quando se diz «poema sinfónico» fala-se exactamente, e não de um modo translato e fácil. O caso parece menos simples para as artes visuais, mas, se nos prepararmos com a consideração de que linhas, planos, volumes, cores, justaposições e contraposições são fenómenos verbais dados sem palavras, ou antes por hieróglifos espirituais, compreenderemos como compreender as artes visiais, compreenderemos como compreender as artes visuais, e, ainda que as não cheguemos a compreender ainda, teremos, ao menos, já em nosso poder o livro que contém a cifra e a alma que pode conter a decifração. Tanto basta até chegar o resto.
Álvaro de Campos, Sobre a Arte 

1936
Fernando Pessoa, Textos de Crítica e de Intervenção. Lisboa: Ática, 1980, p. 279.
(1ª publ. in “Presença”, nº 48. Coimbra: Jul. 1936)


17/06/2017

Reflectir

Museo Nacional de Ciencia y Tecnología, Coruña


A língua portuguesa é rica e dolorosa quando quer. Detesto vulgaridades.
Gaja, é calão ou é vulgar?



13/06/2017

a Senhora Duquesa de Brabante

Um dia feliz é aquele em que nas memórias do mar se descobrem poemas como este de Gomes Leal: Senhora de Brabante.
Gratíssima a quem me falou nele.



Agradeço a todos a visita. Em breve regressarei. :)) 

A Senhora de Brabante

Tem um leque de plumas gloriosas,
na sua mão macia e cintilante,
de anéis de pedras finas preciosas
a Senhora Duquesa de Brabante.

Numa cadeira de espaldar dourado,
Escuta os galanteios dos barões.
— É noite: e, sob o azul morno e calado,
concebem os jasmins e os corações.

Recorda o senhor Bispo acções passadas.
Falam damas de jóias e cetins.
Tratam barões de festas e caçadas
à moda goda: — aos toques dos clarins!

Mas a Duquesa é triste. — Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
— Ao luar, sobre os tanques chora a água...
— Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Dizem as lendas que Satã vestido
de uma armadura feita de um brilhante,
ousou falar do seu amor florido
à Senhora Duquesa de Brabante.

Dizem que o ouviram ao luar nas águas,
mais louro do que o sol, marmóreo, e lindo,
tirar de uma viola estranhas mágoas,
pelas noites que os cravos vêm abrindo...

Dizem mais que na seda das varetas
do seu leque ducal de mil matizes...
Satã cantara as suas tranças pretas,
— e os seus olhos mais fundos que as raízes!

Mas a Duquesa é triste. — Oculta mágoa
vela o seu rosto de um solene véu.
— Ao luar, sobre os tanques chora a água...
— Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

O que é certo é que a pálida Senhora,
a transcendente dama de Brabante,
tem um filho horroroso... e de quem cora
o pai, no escuro, passeando errante.

É um filho horroroso e jamais visto! —
Raquítico, enfezado, excepcional,
todo disforme, excêntrico, malquisto,
— pêlos de fera, e uivos de animal!

Parece irmão dos cerdos ou dos ursos,
aborto e horror da brava Natureza...
— Em vão tentam barões, com mil discursos,
desenrugar a fronte da Duquesa.

Sempre a Duquesa é triste. — Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
— Ao luar, sobre os tanques chora a água...
— Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Ora o monstro morreu. — Pelas arcadas
do palácio retinem festas, hinos.
Riem nobres, vilões, pelas estradas.
O próprio pai se ri, ouvindo os sinos...

Riem-se os monges pelo claustro antigo.
Riem-se vilões trigueiros das charruas.
Riem-se os padres junto ao seu jazigo.
Riem-se nobres e peões nas ruas.

Riem-se aias, barões, erguendo os braços.
Riem, nos pátios, os truões também.
Passeia o duque, rindo, nos terraços.
— Só chora o monstro, em alto choro, a mãe!...

Só, sobre o esquife do disforme morto,
chora, sem trégua, a mísera mulher.
Chama os nomes mais ternos ao aborto...
— Mesmo assim feio, a triste mãe o quer!

Só ela chora pelo morto!... A mágoa
lhe arranca gritos que a ninguém mais deu!
— Ao luar, sobre os tanques chora a água...
— Cantando, os rouxinóis lembram o céu...


António Duarte Gomes Leal, in Antologia Poética, retirado do Citador


10/06/2017

notivagos - os anjos também choram

Notivagos


Do novo livro da minha amiga Graça, uma escolha para o Dia de Portugal (de Camões e das Comunidades Portuguesas):

os anjos também choram

os anjos também choram
mesmo nas manhãs mais sublimes
quando o sol acorda lento e devagar
as lágrimas dos anjos
são risos e asas e brandura
homens a digladiar-se 
festas e risos falsos 
quando os anjos adormecem
são felizes e riem
porque sonham com o Éden
onde moram para sempre
e deixam de ser anjos
a afugentar monstros e lobisomens
numa corrida desesperada
de asas incansáveis
mas se já não há deuses
que importa o choro dos anjos
a derramar-se para cá das nuvens
e a fazer infelizes os homens
que sentem as suas lágrimas

Graça Alves, Da Timidez dos Homens, Coimbra: Palimage, 2017, p.42.

 

02/06/2017

Jardim privado sem "neblina"

Olhar proibido para o jardim privado.

A neblina

Realmente, não é sábio
Aquele que não conhece a escuridão,
Que inevitavelmente e em silêncio
Nos separa dos outros.

É estranho andar na neblina!
A vida é solidão.
Nenhum de nós conhece os outros,
Todos estamos sozinhos.

Herman Hesse "A neblina" in A Sublime Arte de Envelhecer de Anselm Grün [monge beneditino] (Prefácio de Mons. Vitor Feytor Pinto). Prior Velho, Edições Paulinas, 2011 (3ª edição), p. 46.




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