Como é possível tirar harmonia deste instrumento bizarro?
A arte livra-nos ilusoriamente da sordidez de sermos.
A arte livra-nos ilusoriamente da sordidez de sermos. Enquanto sentimos os males e as injúrias de Hamlet, príncipe da Dinamarca, não sentimos os nossos — vis porque são nossos e vis porque são vis.
O amor, o sono, as drogas e intoxicantes, são formas elementares da arte, ou, antes, de produzir o mesmo efeito que ela. Mas amor, sono, e drogas tem cada um a sua desilusão. O amor farta ou desilude. Do sono desperta-se, e, quando se dormiu, não se viveu. As drogas pagam-se com a ruína de aquele mesmo físico que serviram de estimular. Mas na arte não há desilusão porque a ilusão foi admitida desde o princípio. Da arte não há despertar, porque nela não dormimos, embora sonhássemos. Na arte não há tributo ou multa que paguemos por ter gozado dela.
O prazer que ela nos oferece, como em certo modo não é nosso, não temos nós que pagá-lo ou que arrepender-nos dele.
Por arte entende-se tudo que nos delicia sem que seja nosso — o rasto da passagem, o sorriso dado a outrem, o poente, o poema, o universo objectivo.
Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência.
s.d.
Bernardo Soares, Livro do Desassossego, Vol II."Fase confessional", segundo António Quadros (org.) Mem Martins: Europa-América, 1986.
Realmente, não será fácil, Ana.
ResponderEliminarDestaco uma frase deste texto :
" Mas amor, sono, e drogas tem cada um a sua desilusão. "
Mas não vou deixar passar em branco esta outra :
" Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência. "
E muito mais podia dizer, Ana...
Um beijo muito amigo e bom fim de semana.
Obrigada, João.
EliminarUm beijo muito amigo. :))
Ana, Há um poema de Antonio Cícero - "Guardar" que diz: Por isso melhor se guarda o voo de um pássaro /Do que um pássaro sem voos." A arte é libertação... Bom final de semana. Beijos.
ResponderEliminarJane,
EliminarQue bonito. Vou procurar esse poema.
Obrigada.
Beijinho. :))
Os instrumentos musicais são tão interessantes,
ResponderEliminarcomo esta passagem do Livro do Desassossego...
Que seria de nós se nos faltasse a arte, que
inclui a literatura e a música, citando apenas
as fundamentais!
Um Domingo muito carinhoso e especial.
Beijinhos
~~~~~
Obrigada, Majo.
EliminarDesejo que o seu Domingo seja igualmente carinhoso e especial. :))
Beijinho muito grato.:))
Boa noite. Hei-de voltar amanhã para apreciar devidamente o que a Ana nos trouxe.
ResponderEliminarBoa noite Bea,
EliminarGosto muito de a ver por cá.
Até amanhã.:))
Pois...os dedos dos artistas de rua não fazem muita diferença dos de qualquer pianista. Só que estes não têm partitura, tocam de ouvido e utilizam um instrumento que não lembraria a ninguém como musical.
ResponderEliminarBernardo Soares escreve profundamente. Algumas vezes julgo que entra na alma universal de todos nós e parecem-me as suas palavras uma íntima espreitadela, um secreto desvendar. Outras, não o entendo nas contradições que expressa. Mas nem tudo é de compreender.
Um abraço e bom domingo
Obrigada, Bea.
EliminarBoa semana!:))
A música e bela e gostei imenso deste excerto do Livro do Desassossego. Obrigada pela partilha. Beijinhos Ana!
ResponderEliminarAchei muito interessante esta ideia da arte e tive que a expor.
EliminarObrigada, ;argarida.
Beijinho e boa semana!:))
Imaginação e talento.
ResponderEliminarBeijinhos, boa semana
Talento, sim, pois tirar som daquela "lata" é difícil.:))
EliminarBeijinho. :))
Uma interessante revelação para mim, que desconhecia!
ResponderEliminarE uma bela combinação!
Beijinhos, Ana e boa semana.:))
Bom fim de semana, Cláudia.:))
EliminarObrigada pela visita. :))
Que bizarro instrumento, de facto :)
ResponderEliminarBernardo Soares é mais um dos heterónimos a entrar para o ano nos programas do 12º ano!
Belo som, também! Fez-me animar um pouco :(
Beijinhos, Ana!
Graça,
EliminarQue bom que te animou.
Desejo que venha por aí algum sol e que te anime mais e mais.
Beijinho. :))
Não importa o bizarro, o instrumento.
ResponderEliminarO que importa é aquele que faz arte,
que põe o brilho da alma à tona,
que toca e nos toca.
Importa é aquele que desassossega.
Bj.
Adorei esse instrumento tipo disco voador. Não conhecia.
ResponderEliminarSeu blog é muito legal, adorei o poema recitado por Villaret.
Abraços.