31/12/2022

"A história nega as coisas certas" - Feliz Ano Novo!


Columbano Bordalo Pinheiro, Natureza morta,  1899, Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado

http://www.museuartecontemporanea.gov.pt/pt/pecas/ver/376

A história nega as coisas certas. Há períodos de ordem em que tudo é vil e períodos de desordem em que tudo é alto. As decadências são férteis em virilidade mental; as épocas de força em fraqueza do espírito. Tudo se mistura e se cruza, e não há verdade senão no supô-la. 

s.d.

Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.II. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982.

  - 410.
"Fase confessional", segundo António Quadros (org.) in Livro do Desassossego, por Bernardo Soares, Vol II. Fernando Pessoa. Mem Martins: Europa-América, 1986. 
http://arquivopessoa.net/textos/327 
                                                Enfim, que o futuro seja melhor!
                            Desejo a todos um Feliz Ano Novo!


Onde me apetecia estar...


Incontornável com esta canção!

Cortesia do youtube.


 

22/12/2022

Chove. É dia de Natal!

  Feliz Natal!

François Boucher - La Lumière du monde (Adoration des bergers), 1750
Museu do Louvre, Paris 
https://collections.louvre.fr/en/ark:/53355/cl010054819


Chove. É dia de Natal.

Chove. É dia de Natal.

Lá para o Norte é melhor:

Há a neve que faz mal.

E o frio que ainda é pior.

E toda a gente é contente

Porque é dia de o ficar.

Chove no Natal presente.

Antes isso que nevar.

Pois apesar de ser esse

O Natal da convenção,

Quando o corpo me arrefece

Tenho o frio e Natal não.

Deixo sentir a quem quadra

E o Natal a quem o fez,

Pois se escrevo ainda outra quadra

Fico gelado dos pés.

25-12-1930

Poesias. Fernando Pessoa. (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995). 

 - 127.

 


Maria Betânia, Alberto Caieiro -Guardador de Rebanhos 

VIII - Num meio-dia de fim de Primavera


11/12/2022

Para um amigo!

Homenagem a Manuel Poppe:

 As palavras não dizem nada... quando querem dizer tudo.


Buscava o amante a amada para preencher o vazio, resolver a insatisfação. O mesmo buscava a amada no amante. Fugiam de se verem ou tentavam ver-se um no outro?

Manuel Poppe, Novas Crónicas Italianas, Lisboa: Teorema, 1994 p.140.

https://ulysseias.ilcml.com/pt/termo/poppe-manuel/

Itália foi o nosso ponto de contacto. Voe para a sua Roma e as estrelas!

Plácido Domingo - Puccini: Tosca, "E lucevan le stelle"


Para a Maria João
Pavarotti, Una Furtiva Lagrima, Donizetti




Os dois vídeos são cortesia do youtube.



10/12/2022

La Vérité (?)

 A verdade é questionável.

Santa-Rita, pintor, Cabeça (obra inacabada)
c.1913
http://www.museuartecontemporanea.gov.pt/ArtistPieces/view/139/artist

«Oferecido pelo autor a Manuel Jardim. Transitou para a colecção de Henrique de Vilhena, que mais tarde o doou ao Estado. Pertenceu à colecção da Secretaria de Estado da Cultura. Depositado no MNAC– Museu do Chiado em 1994 e incorporado em 2007».

O mistério envolve esta pintura inacabada, verdadeira obra axial do Primeiro Modernismo português. Mentor, estímulo e motor do Movimento Futurista entre nós, Santa-Rita deixou uma escassa produção, sendo as suas obras mais emblemáticas apenas conhecidas através de fotografia – e nenhuma delas apresenta a qualidade radical e coerência formal que esta obra revela. Nela, a assunção dos valores do Cubismo analítico evidencia-se na desconstrução da cabeça em facetas de recorte triangulado e, inusitadamente, curvo. O referente dos olhos, do nariz e do bigode, este metaforizado a partir das aberturas sonoras dos instrumentos de corda, são outros tantos elementos provindos da prática cubista, assim como o pontilhado que se destaca numa das reservas. Contudo, a utilização estrita do negro e cinzentos de sabor metálico reforça o carácter maquinista da figura, reforçado pela dinâmica curvilínea dos planos, numa síntese inédita entre o Cubismo e o Futurismo.

Raquel Henriques da Silva, MNAC


RTP-Ensina




08/12/2022

Jan Van Eyck, uma das suas pinturas que desconhecia!

A beleza lava a alma! 
Foi assim que me senti ao observar a pintura e ao ler o texto incluso.

 Jan Van Eyck, Senhora das Trovoadas, 1437, Museus Reais de Belas-Artes da Bélgica


https://www.facebook.com/groups/artemuseuspatrimonio/permalink/5646012465434309/

A SENHORA DAS TROVOADAS. Como o santoral de 4 de Dezembro evoca Santa Bárbara, que protege as pessoas das trovoadas e é padroeira dos mineiros, dos artilheiros e de quantos trabalham com o fogo, escolho Jan Van Eyck e uma extraordinária 'grisaille' assinada e datada de 1437, sobre tábua de carvalho, que se expõe nos Museus Reais de Belas-Artes da Bélgica. Aí se vê, em desenho sublime, a santa mártir sentada com a palma e o livro entreaberto. Nascida em 280 em Nicomédia (Turquia), Bárbara abraçou a fé cristã e por isso foi encerrada por seu pai Diáscoro numa torre altaneira, sendo martirizada em 317 d.C. por ordem do prefeito Marciniano. Segundo a ´Lenda Dourada' de Jacopo de Varazze, a cabeça da santa, ao tombar, gerou um relâmpago que fulminou Diáscoro. O grande pintor flamengo representou a Santa mártir diante da sua torre-prisão gótica, e tomou o tema como pretexto para nos mostrar os pormenores de um estaleiro medieval em plena azáfama de operários e alvenéis, sob um céu tempestuoso.

                                                                  Vitor Serrão

https://www.facebook.com/groups/artemuseuspatrimonio/permalink/5646012465434309/

E porque nos aproximamos do Natal: cortesia do youtube

https://www.youtube.com/watch?v=CSiEeFhXsLQ&list=RDCSiEeFhXsLQ&index=2



07/12/2022

"Ser" Professor - até onde o novo caminho?

O ADMIRÁVEL PROFESSOR NOVO DO SÉCULO XXI

                                                                                                         


Rafael Sanzio, ,A Escola de Atenas, 1509-11, fresco, base 772 cm, Vaticano.

« Há poucas semanas, um governante da área da Educação deu uma palestra numa instituição de formação inicial de professores, a convite de alguém com responsabilidades na instituição. Perante uma audiência que se supõe formada em boa parte por alunos da licenciatura e mestrado em Educação, potenciais futuros professores, o dito governante, pelo menos nos minutos de gravação da sessão a que tive acesso, apresentou a sua tese de que não se deve avaliar a qualidade de um professor ou a sua adequação à função com base na sua média académica ou na graduação profissional (que inclui o tempo de serviço, para além daquela média).

A teoria tem a legitimidade de todas as teorias para ser apresentada, mesmo que esteja errada ou se baseie em                                           

pressupostos enviesados. A questão está no público a que se dirige a mensagem. Neste caso, no essencial, está-se a dizer a alunos da formação inicial de professores que a avaliação do seu esforço, do seu trabalho e do seu desempenho ao longo de cinco anos de formação académica não constitui um critério adequado para considerar a sua qualidade como docentes. No fundo, que ma avaliação dessa formação, feita por professores certificados, num curso certificado a decorrer numa instituição reconhecida e acreditada oficialmente, é secundária em relação a algo como o um vago “perfil de competências”, a definir caso a caso, de acordo com o tipo de “projecto educativo” em desenvolvimento num dado agrupamento ou escola. Que a sua futura contratação ou mesmo vinculação ao quadro de uma “unidade orgânica” deverá depender mais do modo como se apresentar a um comité de composição desconhecida e variável, do que ao trabalho que desenvolveu ao longo de dois ciclos de estudos no Ensino Superior.

Pode parecer um disparate, uma completa falta de respeito pela própria instituição e pela sua oferta educativa, bem como pelos próprios formadores dos futuros professores, mas é realmente este o tipo de ideologia e preconceito que se anda a espalhar pela opinião pública – e pelos vistos, pelos próprios meios académicos – acerca do que deve ser considerado como o professor adequado ao “ensino do século XXI”.

De acordo com esta visão das coisas, um professor – e esclareço desde já que uso o masculino por comodidade da formulação e crescente irritação com o imperativo de uma linguagem neutra em termos de género – não deve ser avaliado pelo seu desempenho académico, pela sua experiência profissional, mas sim pela forma como fique bem na selfie ou entrevista feita para o cargo, como se

 V aso Pronomos, Pintor de Pronomos, Ática. Museu Arqueológico 
                                                                                                     Nacional de Nápoles, 410 a.C , Itália
uma  escola fosse uma qualquer fábrica ou empresa, em que o patrão recruta quem bem entende, mais ou menos qualificação. Como se fosse uma espécie de assessor ou chefe de gabinete governamental ou autárquico.

Já em Setembro se podia ler, em notícia do Público, que se pretendia “encontrar um modelo que garanta que uma escolha com um perfil de competências seja também objectivo, rigoroso, criterioso”, o que entra em completo divergência com o desejo de total desregulação do concurso de docentes, atomizando-o em concursos locais, municipais ou intermunicipais. Mais grave, pretende-se que a gestão dos recursos docentes das escolas seja feita por uma espécie de conselho (inter)municipal de professores, com poderes para “alocar” os docentes, conforme o tal “perfil de competências”. Não é por acaso que não se esclarece se isso se aplica apenas aos professores que entram no sistema, se também aos que já nele se encontram vinculados.

Este “novo paradigma”, como agora é habitual designar-se qualquer proposta de alteração seja ao que for, corresponde a políticas de matriz neoliberal que é estranho encontrar num governo que se afirma de “esquerda” e defensor de uma Escola Púbica para todos, sendo maior a estranheza por não existir no seu recente programa, aprovado no Parlamento, qualquer referência neste sentido. Ou seja, enquanto no passado se recusaram medidas por não terem sido apresentadas ao eleitorado e à Assembleia da República, agora avança-se com alterações que ninguém sufragou ou validou.

O que está em causa verdadeiramente é o desejo de fragmentar por completo a profissão docente, beneficiando da saída de grande parte dos professores mais antigos e do desânimo de muitos outros que só esperam pela hora de saírem. Com a ajuda de um corpo de directores que, numa boa quantidade, podemos considerar de 2ª geração e que chegaram ao cargo, não na sequência de um trajecto anterior à legislação em vigor de modelo único de gestão escolar unipessoal, mas já de acordo com esse modelo com que, no essencial, se identificam. E todo querem corpos docentes domesticados nas suas escolas e sem capacidade de união e solidariedade em movimentos de contestação colectiva.

Neste objectivo, estão unidos tutela, alguns autarcas e uma proporção indefinida de directores que quando se manifestaram sobre estas mudanças, afirmaram a sua indignação por não terem sido, antes de mais, consultados. E eu não consigo esquecer que há casos que se querem apresentar como “isolados”, mas que são sintomáticos dos perigos deste novo modelo de contratação, vinculação e gestão do pessoal docente, como o daquele director que se apressou a defender um “novo olhar” sobre essa questão, para pouco depois sabermos de que forma no seu agrupamento se “agilizava” a contratação em regime familiar. Garantindo-se o cumprimento da lei, claro, como sempre acontece nestes casos.

Contra este estado de coisas, desenvolvimento a coberto de uma escassez de professores para substituições precárias, há que reconhecer a frontalidade do dirigente da ANDE (Associação Nacional de Dirigentes Escolares) que em declarações ao Público no dia 21 de Novembro apresentou as coisas de modo muito claro, sublinhando que as alterações não se destinam a resolver nenhum problema existente e que “os professores estão desapontados e até zangados [pois] são o único corpo da administração pública a quem não foi contado todo o tempo de serviço prestado no período do descongelamento e os professores do continente são os únicos sujeitos a afunilamentos artificiais na carreira que impedem o seu desenvolvimento profissional e a respectiva retribuição financeira.”

À data que escrevo, talvez por também não terem sido consultadas oficialmente, nenhuma organização parental se pronunciou sobre o assunto. Ficamos sem perceber se também esperam apenas por ter assento num qualquer organismo (inter)municipal destinado à definição do “perfil de competências” dos professores a contratar e vincular. Em especial dos “novos professores” para quem falou o governante que referi mais acima, cujo perfil deve obedecer às exigências dos novos tempos, de submissão hierárquica, flexibilidade laboral e desvalorização do seu saber académico.

Deseja-se que esses admiráveis professores novos, estejam imbuídos de uma formação para o século XXI que deve conter um conjunto de características que já se tornou fácil adivinhar.

O admirável professor novo do século XXI deve ser alguém desprovido de memória, para que não se lembre de tempos em que a independência profissional era algo com alguma substância e em que o espírito crítico não era um chavão demagógico para consumidores de “perfis”.

O admirável professor novo do século XXI deve ser flexível, para que se possa adequar a tudo o que lhe seja exigido, sem pretensões de resistência aos desmandos que lhe sejam impostos e sem qualquer capacidade de contestação dos dogmas que a “boa cartilha” de uma educação falsamente inclusiva lhe apresenta como a única possível.

O admirável professor novo do século XXI deve ter competências transversais, sendo desnecessário e menos contraproducente um saber disciplinar específico, porque isso é desnecessário num tempo em que é mero orientador de aprendizagens mínimas, sem qualquer tipo de avaliação externa consequente.

O admirável professor novo do século XXI deve ser um utilizador entusiasmado das ferramentas digitais, mas numa óptica da utilização pacífica e passiva para pesquisa ou preenchimento de formulários, e não da sua apropriação como um meio de emancipação e muito menos como recurso para reduzir o controle burocrático da sua actividade.

O admirável professor novo do século XXI deve ser adepto das teorias críticas e da visão emancipatória da Educação, mas apenas na perspectiva dos alunos, porque no seu caso deve, antes de mais, ser dócil, colaborativo e submeter-se, sem especial estremecimento de indignação, a tudo aquilo que lhes apresentam como inovação, mesmo se é teoria com cheiro a mofo, laca e muita memória de patchouly

Paulo Guinote

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